quarta-feira, 13 de março de 2013

O Artifício da Loucura


DA  ARTE  COMO  CONSEQUÊNCIA

Toda a arte é sempre uma consequência. Consequência da família, da cidade, do país, do mundo. Consequência ainda do segundo, da hora, do ano.
 
Em todos os meridianos o homem deve tender para a sua perfeição, perfeição que se traduzirá em utilidade. Esta utilidade, porém, deve manifestar-se mais na nossa actividade social diária do que nas obras que realizamos por imperativo estético. Estas não são imediatamente úteis à comunidade; são, sim, imediatamente úteis ao indivíduo que as produz, porque ajudam a libertá-lo, consciencializando-o para realizações mais capazes de o integrarem no substrato nacional de que não nos podemos alhear.
 
É preciso, sobretudo, dar unidade às nossas acções todas e conceber a execução da arte como factor de construção interna, construção que é sempre evolução e progresso para nós e que se reverte, por força moral, em utilidade para os outros, para a cidade, para o país, já que a vida comunitária nos impõe sempre uma qualquer forma de participação, de actividade diária onde podemos espalhar as sementes de nossas conclusões. A vida, então, mais do que a crítica de arte, nos dirá se fomos ou não sábios em nossas descobertas. Só assim se poderá progredir, pela entrega de todas as nossas pulsações àquilo que dizemos amar. Mas este amar obriga-nos a destruir para reconstruir segundo as nossas paixões, ou impulsos da família, da cidade, do país, do mundo.
 
Tudo isto, porém, tudo isto submetido à lei do tempo, imprime à vida um ritmo novo e ao espírito uma sageza que não pode contemporizar com atrofias de qualquer espécie.  
 
Augusto Mota, texto 8 de «O Artifício da Loucura», 1962 a 196

- Discorrências sobre o nosso próprio limite.

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