sexta-feira, 15 de março de 2013

O Artifício da Loucura


PERSPECTIVA  DE  UMA  POSIÇÃO  DIMENSIONISTA-ACTUANTE

Descobrir em cada objecto a sua verdadeira essência é desdobrar cada partícula em ritmo de força e de vida. Força e vida serão para nós sentimentos demasiado humanos para os fossilizarmos, inertes, em sua contextura superficial, porquanto todo o movimento que possa descobrir-se na vida das coisas e dos próprios seres é sempre uma tradução rítmica da atomização de suas moléculas.
 
Amamos, então, mais o interior das coisas  (mas sempre em compromisso com o exterior)  para as dominarmos. O domínio da matéria terá que ser a característica suprema de toda a criação. Aí reside a finalidade do acto. Ser traído pela matéria, julgando que se alcançou a forma, será abortar a intenção lógica do pressuposto artístico. Esta condição exigível não é invenção de uma época. Foi sempre jugo aceite para uma derrota-em-êxito-fácil. Ela, a condição exigível  (ou a derrota que existe na própria definição de exigência), tem sido religião de todos os que, embora conscientes do fracasso imediato, não renegam os princípios de uma exigente preocupação social e lutam pela manutenção de uma escala de valores a que, por direito próprio, se mantêm conscientemente fiéis. Nesta religião reside quase toda a possibilidade de entendimento de uma única forma e força de expressão, em que um conteúdo humano e psicológico latente no cerne da nossa constituição se imiscui, por simpatia e não por vaidade, na descoberta, melhor no desvendar do compromisso interior-exterior das coisas.
 
É, pois, neste dissecar tantas vezes sangrento que radica o amor próprio e a característica suprema de toda a criação como finalidade, como exigência e, acima de tudo, como vontade.
 
Augusto Mota, texto 9 de «O Artifício da Loucura», 1962 a 1964
 
- Discorrências sobre o nosso próprio limite.

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